Autorização para construção de novas ferrovias soma quase 10 mil quilômetros de extensão
Vinte e sete contratos foram firmados desde a sanção do novo marco legal, em dezembro. Indústria vê oportunidade única de ampliar volume e diversidade do transporte ferroviário de cargas
A aprovação da Lei de Ferrovias (lei nº 14.273/2021), em dezembro do ano passado, estabeleceu uma série de mecanismos com o potencial de avançar ainda mais no bom momento que o setor vive com as obras em curso de expansão e a modernização da malha. O principal deles refere-se ao regime de outorgas de autorização para construção e operação de ferrovias pelo setor privado.
Desde a viabilização do regime de autorizações ferroviárias no ano passado, já foram assinados 27 contratos para a construção de um total de 9.923 quilômetros de ferrovias, somando R$ 133,2 bilhões de potencial investimento, segundo dados atualizados nesta terça-feira (10) pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Ainda existem mais de 50 requerimentos em análise pelo Ministério da Infraestrutura.
O aumento da oferta de serviços de transporte ferroviário com esses empreendimentos tende a contribuir para um maior equilíbrio da matriz de transportes brasileira. Embora o país tenha condições geográficas favoráveis para a utilização das ferrovias, o modal ferroviário responde por apenas 4% da movimentação doméstica de cargas, excluindo minérios e combustíveis, enquanto o transporte rodoviário representa mais de 85% do total.
A nova lei prevê também o chamamento público para a exploração de ferrovias ociosas ou abandonadas, sendo que os atuais concessionários também poderão requerer à entidade regulatória a desativação ou a devolução de trechos sem tráfego ou antieconômicos. Na avaliação da Confederação Nacional da Indústria (CNI), esse dispositivo apresenta o potencial de auxiliar na destinação dos cerca de 11 mil km de trechos ferroviários que estão há décadas sem tráfego. Desse total, 6,9 mil quilômetros estão com vias permanentes (trilhos e dormentes) degradadas a tal ponto que não é mais possível o tráfego de locomotivas. Outros 4,2 mil quilômetros, apesar de apresentaram condições de tráfego, não registram operações de transporte programadas pelos operadores ferroviários.
Mesmo com a grande quantidade de trechos sem tráfego, menos de mil quilômetros de trechos ferroviários foram efetivamente devolvidos à União pelos concessionários atuais desde a assinatura dos contratos nos anos 1990. Em sua maioria, os trechos devolvidos não tiveram qualquer destinação e estão, na prática, abandonados. Tal situação é reflexo dos problemas em planejamento, regulação, fiscalização e operacionalização do setor ferroviário no país. Segundo informações do governo, após a nova lei, é esperada a devolução à União de cerca de 2 mil quilômetros de ferrovias.
Workshop virtual reuniu representantes da indústria e do governo
A CNI realizou workshop virtual nesta terça-feira (10) para debater o tema. Participaram representantes da indústria e integrantes do governo e de órgãos públicos. Entre os participantes estavam Mônica Messenberg, diretora de Relações Institucionais da CNI; Wagner Cardoso, gerente-executivo de Infraestrutura da CNI; Ismael Trinks, superintendente de Transporte Ferroviário da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT); André Ludolfo, coordenador-Geral de Outorgas Ferroviárias do Ministério da Infraestrutura; Maurício Ferreira Wanderley, diretor-técnico da Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Portuária e Ferroviária do Tribunal de Contas da União (TCU); Jean Carlo Trevizolo, coordenador-Geral de Obras Ferroviárias do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT); e Paulo Resende, professor da Fundação Dom Cabral.
Para Mônica Messenberg, os novos projetos tendem a ampliar com rapidez a malha ferroviária brasileira. “Aumentar a presença da carga da indústria na movimentação ferroviária é uma antiga demanda do setor produtivo nacional. O bom momento que nossas ferrovias atravessam pode viabilizar não apenas a expansão da malha, mas também o aumento do volume e da variedade das cargas transportadas”, afirmou a diretora da CNI.
Aumentar a utilização para expandir a quantidade e variedade de cargas transportadas
O transporte ferroviário no Brasil apresenta significativa concentração em determinadas mercadorias, operadores e corredores voltados para a exportação. No caso das cargas conteinerizadas, apesar da movimentação ter dobrado em duas décadas, o volume de contêineres representa atualmente cerca de 1% da produção anual de carga ferroviária. A título de comparação, os portos brasileiros movimentaram 133 milhões de toneladas de contêineres em 2021, o que torna o fluxo de 5,3 milhões movimentados nas ferrovias equivalente a 4% desse volume. Os contêineres apresentam grande importância para o comércio de mercadorias e insumos industriais de maior valor agregado.
Perspectivas com a Lei de Ferrovias e as autorizações ferroviárias
O momento atual apresenta boas perspectivas para a solução dos gargalos no setor ferroviário. Ao mesmo tempo que persiste o problema do subaproveitamento e abandono das ferrovias, o Brasil tem presenciado uma revolução silenciosa no setor. Após um longo período de baixos investimentos, as obras ferroviárias estão em pleno vigor, viabilizadas pela prorrogação dos contratos firmados na década de 1990 e da concessão de trechos de ferrovias recém-concluídos ou para construção. Com a nova lei e o regime de autorizações, é possível avançar ainda mais.
O aumento do escoamento da produção nacional por meio das ferrovias é uma demanda antiga do empresariado brasileiro, especialmente o industrial, e demanda uma maior mobilização de recursos e articulação entre diferentes atores do setor produtivo e do governo, incluindo a ANTT, Ministério da Infraestrutura e Casa Civil.
Os novos empreendimentos do setor devem priorizar o aproveitamento e a conectividade da malha, especialmente para o transporte de mercadorias tipicamente movimentadas por caminhões. “Sem dúvidas, esse é o caminho para reduzirmos os custos logísticos, elevarmos a produtividade e, assim, colocarmos a competitividade do país de volta aos trilhos”, pontua Matheus de Castro.
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